Perante uma plateia muito atenta e participativa, o Sindicato das Indústrias da Construção Civil do Rio Grande realizou com sucesso o workshop “Superando desafios na construção civil”, realizado na tarde desta última terça-feira, 5 de novembro, no auditório do CREA/RS.
O evento teve a parceria da DMS Engenharia & Arquitetura, Sistema Fiergs, Sebrae e Sabbado Assessoria em Licitações. Os associados, engenheiros e arquitetos que se fizeram presentes assistiram, inicialmente, a um vídeo institucional do Sinduscon Rio Grande, seguido de uma apresentação da secretária-executiva, Larissa Dias, sobre as atividades do sindicato.

Retenção de talentos na construção
A analista técnica do IEL/Fiergs, Greice de Rossi, apresentou a palestra “Mercado de trabalho e retenção de talentos na construção civil”, um tema que preocupa os empresários do setor. O Instituto Euvaldo Lodi é uma instituição do sistema Fiergs que atua com inovação, talentos e educação executiva.
Rossi falou sobre o projeto integrado que analisa a carência de profissionais no mercado de trabalho, desenvolvido pelo IEL em parceria com entidades como Sesi e Senai por solicitação do Sinduscon RS. A necessidade da qualificação profissional para a obtenção de maior produtividade é um dos pontos apurados pelo estudo.
Inicialmente, a palestrante observou que “a escassez de talentos é um problema global. Tanto que uma pesquisa mostra que em 2014 o mundo registrava uma carência de 36% e esse número foi subindo até que ano passado esse percentual chegou a 75%.”. Entre as economias em desenvolvimento, o Japão apresenta uma carência de 85%, a Alemanha 82%, o Reino Unido e o Brasil 80%.
A construção civil também sente dificuldades de atração e retenção de talentos no mundo todo. Greice de Rossi informou que nos Estados Unidos a escassez de mão de obra na construção chega a cerca de 650 mil trabalhadores, causando atraso na conclusão de projetos. Com a “cascata de atrasos” e a interrupção na cadeia de abastecimento, os preços dos materiais estão agora mais elevados que em 2020. As mudanças culturais contribuem para agravar esse déficit, uma vez que os pais não desejam que seus filhos se tornem trabalhadores da construção civil. Nos últimos 40 anos, as pessoas passaram a achar que a única forma de terem sucesso na vida é com diploma universitário e esse pensamento afasta os jovens dos cursos técnicos.
Segundo a Confederação Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), 90% das empresas passam por dificuldades para atrair novos profissionais, enquanto 72% estão dispostas a custear qualificação a seus empregados. Ainda segundo a CBIC, os profissionais com maior escassez na construção são: pedreiro, 82%; carpinteiro, 78%; mestre de obras, 74% e encarregado, 70%.

Salários baixos e falta de interesse no trabalho pesado
Conforme a representante do IEL, a Global Construction Survey Report 2023 fez uma pesquisa com a chamada geração Z, aquela nascida a partir de 1996, e apurou os principais motivos para esses jovens não desejarem trabalhar na construção: existe um desalinhamento do que eles procuram como estilo de vida e o que o trabalho no setor pode oferecer para eles, que valorizam o equilíbrio entre a vida pessoal, profissional e bem estar. Também temem risco de lesões ou para a saúde mental.
Greice de Rossi disse que o Brasil precisará de 9,6 milhões de trabalhadores em ocupações industriais até o próximo ano. Para o Rio Grande do Sul serão necessários 758 mil trabalhadores, sendo 149 mil em formação inicial e 609 mil em formação continuada. “O problema é bem grande em todos os setores econômicos”, observou.
Ano passado o IEL de Goiás fez uma pesquisa que apurou para onde foram os profissionais da construção civil. Foi constatada uma migração forte para a informalidade (74,6%) devido a possibilidade de renda maior e mais flexibilidade de horário em relação a quem é CLT. Os motivos apurados para as pessoas não se interessarem em trabalhar na construção: salários baixos, falta de interesse pelo trabalho pesado, baixa mecanização, falta de interesse dos jovens na indústria e condições de trabalho, entre outros.

Estratégias para atração, capacitação e retenção de talentos
Com os dados colhidos em pesquisas, o IEL/Fiergs passou a elaborar projetos visando estratégias para atração, capacitação e retenção de talentos. O trabalho teve como público alvo as incorporadoras, empreiteiras, construtoras, egressos do Senai e profissionais atuantes e foi desenvolvido nas regiões Metropolitana, Serra, Sul (Pelotas) e Centro (Santa Maria). Uma das metodologias foi a formação de grupos focais (grupos com empresários e grupos com egressos e trabalhadores) com reuniões de até 15 pessoas. Também foram ouvidos profissionais em canteiros de obras. O próximo passo será a apresentação de possíveis soluções.
Os grupos focais de empresários tiveram cinco encontros, a participação de 33 pessoas e 12 horas de conversa sobre a escassez de profissionais. Os grupos focais de profissionais e egressos do Senai realizaram cinco encontros com a participação de 44 pessoas e 11 horas de conversa.

O que disseram empresários e trabalhadores
Quais os principais obstáculos para a construção atrair profissionais?
EMPRESÁRIOS – Baixa remuneração, especialmente nos cargos de entrada; concorrência com setores que oferecem melhores benefícios; falta de qualificação e de experiência; impacto do assistencialismo e da informalidade, que desestimulam trabalhadores a buscar emprego.

Que informações seriam positivas para atrair profissionais para a indústria da construção?
EGRESSOS – Oferta de qualificação técnica, salários justos, condições de trabalho seguras, valorização profissional, comunicar melhor as oportunidades e considerar incentivos adicionais para tornar a construção mais atrativa como carreira.

Fatores que podem influenciar a decisão dos profissionais?
EMPRESÁRIOS – Remuneração competitiva com melhores condições de trabalho; comunicação eficaz que mostre o setor da construção como carreira promissora e investir em oportunidades de crescimento e valorização dos trabalhadores, pois hoje um empacotador de supermercado ganha mais do que um servente de obras.

O que percebe como dificuldade ou obstáculo para uma pessoa ingressar na profissão?
EGRESSOS – Falta de reconhecimento formal da experiência, condições de trabalho precárias, falta de valorização dos profissionais (especialmente para os que ocupam cargos físicos mais extenuantes), falta de oportunidades de crescimento e de desenvolvimento para muitos trabalhadores.

Como investe na formação e desenvolvimento da equipe e principais desafios:
EMPRESÁRIOS – Existe uma falta de integração dos cursos com a prática; tentam compensar com treinamentos internos, cursos que precisam ser ajustados em termos de carga horária e duração. Programas de trainée são vistos como oportunidades de desenvolvimento. Envolver mais profissionais nos processos para aumentar a responsabilidade e a comunicação.

Como você percebe o suporte oferecido pela empresa?
EGRESSOS – Variável e insuficiente; empresas menores deixam a desejar nesse suporte; falta de incentivos; condições de trabalho precárias; as empresas até oferecem cursos, mas a maioria não incentiva o desenvolvimento.
Cabe destacar que os empresários veem a tecnologia como compensação para a escassez de profissionais, mas isso enfrenta barreiras financeiras e culturais. Resistência a mudanças e o custo elevado da tecnologia podem retardar o progresso. Se os trabalhadores não forem capacitados para o uso da tecnologia vai ser um impeditivo para que progridam.
Já os egressos veem a tecnologia como auxílio, mas se preocupam que possam ser, em algum momento, substituídos. Novas máquinas e equipamentos são vistos como algo que exige qualificação.

Que iniciativas adota para reter profissionais?
EMPRESÁRIOS – Ambiente de trabalho mais favorável, valorizar o trabalhador, mais benefícios e estimular o crescimento profissional.

Que iniciativas poderiam reter os profissionais?
EGRESSOS – Valorização/reconhecimento de boas condições de trabalho, plano de carreira, capacitação contínua e suporte mais humanizado.

Próximos passos
A representante do IEL/FIERGS adiantou que deverão ser feitas ações coordenadas entre Governo, sindicatos, Fiergs e o setor empresarial para reverter o atual quadro de escassez de talentos, bem como campanhas de valorização e qualificação comportamental dos trabalhadores. O IEL irá contribuir também com a apresentação de outras possíveis soluções para reverter esse quadro.
Greice de Rossi informou, ainda, que dia 2 de dezembro estará acontecendo o 10º Forum IEL de Inovação, em Porto Alegre, que terá como tema “Inovação e resiliência em tempos de adversidade”.

A nova Lei de Licitações na construção civil
A segunda parte do workshop do Sinduscon apresentou o painel “A nova lei de licitações na construção civil”, que teve como painelistas o sócio-diretor da DMS Arquitetura & Engenharia, Rodrigo Marques Freitas, e o CEO da Sabbado Assessoria em Licitações, Leandro Sabbado.
Primeiro falou o gestor de Políticas Públicas do Sebrae, Fabrício Burkert, que destacou a parceria entre aquela instituição e a Prefeitura do Rio Grande no “Cidade Empreendedora”. Disse ele que “em cima de pesquisas e ações que realizamos, constatamos que um dos problemas maiores das pequenas empresas em acessar licitações é a falta de clareza da forma como o Município compra, como paga, em quanto tempo paga. No dia 25 de novembro, a ideia é lançar com a Prefeitura o Plano Anual de Compras, sobre o que o Executivo vai comprar em 2025. Hoje tudo é feito no sistema de pregão eletrônico e nosso trabalho é fazer que esse processo fique mais claro para a micro e pequena empresa. A pequena empresa precisa estar estruturada, ter logística, capital de giro para aguardar o pagamento da Prefeitura. E o objetivo do Sebrae e Prefeitura é fazer que os recursos das licitações fiquem no município, porque boa parte vai para fora de Rio Grande, até para fora do estado”
Outra meta do “Cidade Empreendedora” é a realização de reuniões de negócios para que haja conexão das grandes empresas com os empreendedores menores. “Temos de estar sempre fomentando a educação empreendedora para fazer que os recursos fiquem em Rio Grande ou, quando muito, na região. Se 10% do que era comprado no Polo Naval ficasse aqui, nossa!”
Fabrício Burkert ainda falou na importância do credenciamento das pequenas empresas. “Em Rio Grande estamos montando um projeto piloto, que será lançado dia 25. Imagina licitar, por exemplo, a reparação de vidros nas escolas. Precisamos mostrar como fazer o processo, caso contrário vem uma empresa de fora, que ganha o dinheiro e ainda sub-contrata o vidraceiro daqui para fazer o serviço. Sem o credenciamento, não se apresenta um fornecedor local para oferecer esse serviço”.
Conforme o representante do Sebrae, “vamos fazer credenciamento das pequenas empresas e ficaremos sabendo quem pode fornecer e colocar os vidros nas escolas ou quem faz limpeza de fossas, entre outras atividades. Saberemos o custo dos serviços e os interessados saberão como é feito o processo ou o prazo de pagamento da Prefeitura. Após o empreendedor ser credenciado, ele fica apto a ser chamado. Entra no sistema de rodízio e a ideia é credenciarmos empresas daqui, dos mais variados produtos e serviços, especialmente os que a Prefeitura tem dificuldade de comprar das empresas daqui”.
Burkert citou como exemplos que “a Prefeitura de Rio Grande tem demanda de duas toneladas de peixe por mês para a merenda escolar e não temos fornecedores. Com o pão é a mesma coisa. Por isso vamos utilizar o credenciamento para o empreendedor ficar mais próximo da demanda”.

Participação irrelevante da região
O sócio-diretor da DMS Arquitetura & Engenharia, Rodrigo Marques Freitas, iniciou dizendo que há 18 anos participa de licitações e tem uma parceria com a Sabbado Assessoria em Licitações, uma empresa de Pelotas que atende interessados em fornecer produtos à administração pública. Explicou que o workshop tinha por objetivo trazer uma empresa com expertise no assunto, no caso a Sabbado, para falar às empresas locais interessadas em participar desse processo. Adiantou que a participação das empresas rio-grandinas nas licitações “é irrelevante em relação à fatia do mercado, enquanto nós, da construção civil, representamos 25% do PIB municipal. Então, estamos aqui para falar da nova lei de licitações e mostrar como as empresas locais da construção civil podem aproveitar melhor a nova lei das licitações”.
Leandro Sabbado, por sua vez, falou que “Rio Grande, Pelotas e região não tem construtoras participando do processo para serem fornecedoras ou prestadoras desses serviços” e que a nova legislação “teve mudanças significativas. Hoje grande parte é concorrência eletrônica, pregão eletrônico. A disputa é muito maior. Empresas do outro lado do Brasil conseguem participar de forma eletrônica, até mesmo montando uma rede de suprimentos para participar em conjunto do processo licitatório”.
Rodrigo Freitas salientou que “vamos ter grandes obras em Rio Grande e região, como o financiamento que virá da França para a realização de obras no município, além de outras obras inacabadas. Certamente isso atrairá empresas de fora, especialmente de outros estados. A participação das empresas locais em obras na região é de apenas 3% e precisamos debater como aproveitar melhor essa fatia”. Uma possibilidade é as empresas formarem consórcios com outras de mesmo porte para poderem disputar contratos maiores.
Leandro Sabbado disse que “as dificuldades não são apenas para as empresas, mas os órgãos públicos ainda não estão conseguindo aplicar a lei de licitações. Apenas 1% dos municípios estão preparados e aplicando corretamente. O cenário não é só dificuldade por parte dos licitantes, mas também do licitador”. Ele considera importante a realização do credenciamento de empresas por segmentos de atuação. “Quando abrisse uma demanda teria uma classificação para fazer rodízio”, observou, com a concordância de Rodrigo Freitas: “A vantagem do credenciamento é que todo mundo participa”.
Para Sabbado, “falta muitas vezes a empresa identificar o que está errado e saber se manifestar para ser alterado o edital”.
Os painelistas destacaram que, com a informatização, automaticamente mais pessoas participam das licitações, mas que o agente contratador tem de ter qualificação para elaborar um edital bem feito. Falta também apoio aos municípios, porque muitas vezes eles tomam decisões equivocadas. “Não temos uma qualificação do servidor e isso ajudaria. A qualificação tem de existir, porque o edital é a base de tudo”.
Rodrigo Freitas falou que Paraná e Santa Catarina facilitam a participação de empresas locais em licitações, pois existem instrumentos para isso. Inclusive a lei de micro e pequenas empresas dá preferência a elas em contratos até R$ 80 mil. “Tem a licitação, mas dá preferência à empresa da cidade. É uma lei complementar feita em 2014. Em Santa Catarina já participei de processos assim”, contou ele. Sabbado complementou: “Tem margem de preferência para empresas da região (Micros, Pequenas-MPE e Empresas de Pequeno Porte-EPP) na questão de desempate, e isso traz um pouco de equidade para as empresas menores”.

Universalização das oportunidades
Rodrigo Freitas entende que a nova lei de licitações “veio para universalizar as oportunidades. Tem o Sebrae com o suporte necessário e consultorias para as empresas poderem ter melhor competitividade”. Leandro Sabbado acrescenta: “Também acredito muito que eventos como o de hoje possam chegar aos órgãos públicos, aos municípios, para formularem melhor os editais. O credenciamento vai fazer a diferença e não tenho dúvida que vai dar muito certo. Isso tudo é muito novo e ninguém está preparado. As empresas tem de se qualificar, promover encontros como esse”.
A Sabbado Assessoria em Licitações “está em Santa Catarina, no Paraná e no Mato Grosso do Sul. Em Santa Catarina tem uma parceria com Florianópolis e a CDL na elaboração de um cadastro de compras públicas. A ideia é trazer para perto os fornecedores da região, qualificar eles. Os estados do Paraná, Santa Catarina e São Paulo estão estruturados há mais tempo. Acredito que um escritório de compras públicas seria uma solução”.
Rodrigo Freitas observa, ainda, que “o pessoal tem receio no atraso de pagamento ou em demora no pagamento, pois eles não tem a mesma estrutura que as grandes empresas, mas as oportunidades estão aí. Temos a Furg, Marinha…. Hoje sai licitação de R$ 100 até licitações milionárias e as empresas de fora abocanham as melhores oportunidades”. Sabbado diz que as empresas precisam estar informadas sobre licitações. Para isso, considera o Sebrae “muito participativo” e muitas empresas “formam o que chamam de rede de suprimentos”. Informou que o Senar abriu uma licitação para compras de R$ 35 milhões em Hulha Negra “e não temos uma empresa da região participando”.
Ao concluir, Rodrigo Freitas entende que o consórcio de empresas “junta qualificação, a expertise de cada empresa, a parte financeira e viabiliza a participação delas, mas as empresas também tem de se qualificar. Tem de fazer uma integração entre elas, se unir e ganhar capacidade para evoluir”. No caso da construção, “quem vai dar solução de engenharia é o construtor. Quem tiver a melhor solução de engenharia é mais competitivo”.

Jornalista Ique de La Rocha
Rio Grande, 6 de novembro de 2024.

Assista o resumo do evento no link: https://drive.google.com/file/d/1l9wCnjjAgU1h8STe3zbOpt9OuGKSxP80/view?usp=sharing

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